Decidi não me entristecer mais com a hipocrisia e mediocridade de algumas figuras, já faz algum tempo, e isso tem me feito muito bem. O segredo foi me ensinado por Jorge Amado em seu livro Navegação de Cabotagem.
Criei um cemitério sem covas, muros ou flores. Lá cavei valas rasas onde estão os meus desafetos, o clima é de tristeza e só há ranger de dentes, por conta disso só entro nele quando necessário.
Nesta tarde, enquanto passeava sem compromisso, eis que encontro um dos poucos mortos que lá estão. Se aproximou, cumprimentou-me, ABRAÇOU-ME , relembrou das aventuras passadas onde havia riso e confiança fraterna. Despediu-se com um sorriso reptiliano, cobrou-me por minha ausência, cada vez mais frequentes e seguiu seu caminho, feliz por por sua malandragem e falsa-camaradagem comigo.
Olhei para trás e o vi desaparecer entre as árvores do parque como uma alma-penada, e pensei o quão miserável era a condição do pobre diabo, ele ainda não sabe que é um morto-vivo, que jaz em uma vala rasa com duas pás de cal sobre o corpo inerte em decomposição neste triste cemitério.
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